segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Canção de Ninar IV - A Indiferença ou "Nem tudo é pra crack ou cachaça!"





Marise Jalowitzki
31.agosto.2015
http://marisejalowitzki.blogspot.com.br/2015/08/cancao-de-ninar-iv-indiferenca-ou-nem.html


Estou na fila do caixa-rápido no supermercado, aguardando a minha vez, olhando (como todos) compulsivamente para o sinal eletrônico luminoso que anuncia qual o caixa irá atender.

Quando chego no "nível 5" na fila (só quatro à minha frente), um homem simples, pobre, baixo, velho e aparentando leve embriaguez (ou demência), sai de um dos balcões e se dirige para a nossa fila, comentando para a senhora 1ª da fila:

- Faltou setenta centavos pra eu poder pagar a minha conta. A senhora poderia completar pra mim?

A loura e alta mulher faz de conta que nada nem ninguém havia lhe dirigido a palavra, fez de conta que nem percebera a figura humana a sua frente. Esticou o pescoço e, altiva, olhou para a direita. Na verdade, demonstrava que aquela voz, aquele corpo era "nada" mesmo, para ela. 

O homem ficou parado e quando a "fila andou", repetiu o pedido para o casal de jovens que agora eram os primeiros, os próximos a serem atendidos. Eles também "eram surdos e cegos" e "foram salvos" providencialmente pela chamada do sensor eletrônico. Movimentaram-se apressadamente, apressando-se em apagar da tela mental aquela imagem 'incômoda' de alguém que, por centavos, precisava se humilhar ou então, deixar suas poucas compras.

Nos treze anos de vida profissional na área operacional que tive, por vezes supri o papel de caixa e, mais de uma vez, cobri algumas situações como esta. Com certeza, fosse comigo, nem exporia um senhor desprovido a uma situação assim desamparada. 

Terceira investida. Idêntica reação. Tirei minha bolsa dos ombros e fui providenciando a carteira. A mulher à minha frente se virou, me olhou reprovativamente e declarou:

- Vais mesmo dar este dinheiro pra ele?

Indignada com toda a cena, e agora ainda mais pelo tom julgador da voz dela, abri os braços, arregalei os olhos, abri um sorriso de mofa e disse:

- Ha! Dinheiro? São só s-e-t-e-n-t-a  c-e-n-t-a-v-o-s!!!

Pois se eu nem havia trocado nenhum olhar com ninguém até ali, não havia comentado nada com ninguém, quem pediu opinião? 

O homem, entendendo meu movimento, acercou-se da baia-corredor, estendeu a mão, voltou ao caixa e pôde sair com suas comprinhas! Estiquei meu olhar para ver o que havia nas compras, enquanto a caixa ensacava: 1 Kg farinha de trigo e uma lata de óleo de soja...

Continuei sem olhar para ninguém dos da fila, pois os juízes-de-todos, ultimamente, mais que antes, estão me provocando ânsia de vômito.

Meio tonta de indignação pela notória falta de compaixão de todos os dias, cheguei ao pátio do estacionamento. Um rapaz saía correndo em desabalada corrida, enquanto um homem maduro, em frente ao seu chevrolet, gritava:

- Ladrão safado! - E, olhando pros lados, completou, para os que quisessem ouvir: 
- Levou minha sacola com pão e pizza! Agora vou ter de subir e comprar de novo!!




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